terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O Poder Público em seus deveres para com o Meio Ambiente na Constituição Federal de 1988

De forma clara e coerente, quer-se relacionar e discorrer sobre os deveres de proteção ambiental do Estado consignados em nível constitucional, utilizando para tanto, inclusive, diferentes fundamentações teóricas.

Neste sentido, de maneira a considerar como Estado o todo federativo e sem pormenorizar as funções de cada um de seus entes, desde já se faz necessário trazer à pauta o que reza o artigo 23, seus incisos e parágrafo único, da própria Constituição Federal da República Brasileira de 1988, que no tocante ao tema em questão assim o faz:

“Artigo 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

I – (...);

II – cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

V - (...);

VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;

VIII - (...);

IX – promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;

X - (...);

XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios.

XII – (...).

Parágrafo único: Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.”

Assim, de acordo com o conteúdo do artigo acima transcrito, entre a leitura de outros tantos da Constituição Federal , é possível observar a relação direta existente entre o social, matéria explicitamente auferida, à exemplo, nos incisos II e IX do mesmo, e o meio ambiente, de maneira a compreender mais de uma de suas formas segundo a classificação adotada pela doutrina majoritária contemporânea : meio ambiente artístico/cultual: incisos III e IV, e, meio ambiente natural e artificial: incisos VI, VII e XI.

Édis Miralé muito brilhantemente explica o porquê da relação existente referida no parágrafo anterior do presente estudo, ao ensinar que “De fato, o capítulo do Meio Ambiente está inserido na Ordem Social. Ora, o social constitui a grande meta de toda ação do Poder Público e da sociedade. A Ordem Econômica, que tem suas características e valores específicos, subordina-se à ordem social. Com efeito, o crescimento ou desenvolvimento socioeconômico deve portar-se como um instrumento, um meio eficaz para subsidiar o objetivo social maior. Neste caso, as atividades econômicas não poderão, de forma alguma, gerar problemas que afetem a qualidade ambiental e impeçam o pleno atingimento dos escopos sociais.“. ou seja, o caráter multidisciplinar da questão ambiental é intrínseco a si e sua tamanha importância é tanta que a Assembléia Constituinte brasileira, já em 1988, atribuía competência comum a todos os entes federados quando em se tratando de fazer por estes, tocando inclusive à sociedade, comunidade , sua responsabilidade em colaborar no mesmo sentido.

No entanto, é com mais especialidade que a Seção III, Do Desporto, Capitulo VI, Do Meio Ambiente, artigo 225 da própria Constituição da República vigente trata do tema ora sob discussão quando garante que:

“Artigo 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através da lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as praticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

Em outras palavras, é correto afirmar que o Poder Público, no tocante ao seu dever de tutelar o meio-ambiente preservando-o e defendendo-o, o faz de forma sistematizada, fragmentada e especificamente, em suma e de acordo com os ensinamentos do Ilustre Édis Milaré, da seguinte maneira: Através da:

a) Preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais, que consiste em garantir, por intermédio de atividades conjugadas de todas as modalidades e esferas do Poder Público, o que está em bom estado original e de recuperar o que foi degradado. Entende-se por processos ecológicos essenciais aqueles que garantem o funcionamento dos ecossistemas e contribuem para a salubridade e higidez do meio ambiente, em termos práticos traduzem-se, por exemplo, na fixação, transformação, transporte e utilização de energia e na biodegradação de rejeitos;

b) Promoção do manejo ecológico das espécies e ecossistemas, que nada mais é do que “cuidar do equilíbrio das relações entre a comunidade biótica e o seu hábitat” ;

c) Preservação da biodiversidade e controle das entidades de pesquisa e manipulação de material genético, isto é, partindo-se do conceito de que biodiversidade é a variedade de seres que compõem a vida na Terra compreendendo a grande variabilidade de organismos existentes, objetiva-se reconhecer, inventariar e manter o leque dessas diferenças de organismos vivos;

d) Definição de espaços territoriais especialmente protegidos, que quando consideradas no sentido lato da expressão, envolvem as Áreas de Preservação Permanente e as Reservas Florestais Legais, as Áreas de Proteção Especial que tenham fundamentos e finalidades distintas das Unidades de Conservação, e as próprias Unidades de Conservação, sejam típicas ou atípicas, fazendo-o também através de normatizações específicas;

e) Realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental: estudo este que é tido como parte integrante do AIA (Avaliação de Impacto Ambiental) e portanto considerado instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente que, através da Resolução CONAMA 001/86, tem estabelecida suas definições, responsabilidades e diretrizes gerais para seu uso e implementação;

f) Controle da produção, comercialização e utilização de técnicas, métodos e substâncias nocivas à vida, à qualidade de vida e ao meio ambiente afim de que se impeçam ações prejudiciais aos mesmos, fazendo-o através de interferências do Poder Público nas atividades econômicas de domínio privado;

g) Educação ambiental, consagrada pelo advento, ainda que um pouco tardio, da Política Nacional de Educação Ambiental, definida na Lei 9.795, de 27.04.1999, e regulamentada pelo Dec. 4.281, de 25.06.2002, dando sequência e eficácia aos arts. 205 e 225, § 1°, VI, da nossa Carta Magna, a educação ambiental propriamente dita está comprometida com possibilidade de salvar o planeta que só existe quando considerada individualmente, em cada cidadão, investido da vontade de reverter o processo de gradual e reiterada destruição da Terra; e,

h) Proteção à fauna e à flora.

À luz de todo o exposto, permite-se concluir que o pseudônimo auferido a Carta Magna vigente, qual seja, “verde”, é digno de respeito e considerações uma vez que toca, inova, amplifica e tutela particularmente cada instituto natural de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, ou seja, a Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 torna o meio ambiente ecologicamente equilibrado direito difuso, coletivo, indisponível e de competência comum dos Estados, Municípios, Distrito Federal e União positivando assim, possivelmente, a única possibilidade de conservar a vida na Terra.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.Org. Cláudio Brandão de Oliveira. 5 ed. Rio de Janeiro: Roma Victor, 2005.
José Afonso da Silva. Direito ambiental constitucional, cit., p. 53

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A gestão Ambiental em foco. Doutrina.Jurisprudência. Glossário. 5. ed. ref, atual. E ampl., São Paulo: Editora RT, 2007, Título II – A base constitucional da Proteção do Ambiente; item 4. A Constituição de 1988, pág 147 a 177. Material da 1ª aula da Disciplina Direito Ambiental Constitucional, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito Ambiental e Urbanistico – Anhanguera-UNIDERP REDE LFG.

TENÓRIO, Dóris. Classificação do Meio Ambiente – Gestão Ambiental (Justiça Federal em Santa Catarina). Em 09 de dezembro de 2008.